Violência contra a mulher : não existe lei contra estupro dentro do casamento
Em 22% dos países não existe lei contra estupro dentro do casamento, diz relatório do Fundo de População, publicado recentemente pela ONU. Essa violência silenciosa é culturalmente aceita em muitos países, mesmo naqueles que contam com instrumentos jurídicos para coibi-la.
No Brasil, a Lei Maria da Penha prevê o estupro marital, mas aspectos sociais, econômicos e culturais, atrelados à desigualdade de gênero, podem dificultar a denúncia e a responsabilização de agressores.
De acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2019, a maior parte dos casos de violência sexual (76%) acontecem dentro do lar, realizado por pessoa próxima, parente ou vizinho. Destes, apenas 7,5% das vítimas formalizaram a denúncia. Apesar de o Brasil possuir legislação específica sobre a temática, barreiras históricas têm dificultado a responsabilização em casos de violência sexual.
No caso do estupro marital, uma das grandes barreiras são as normas sociais e a desigualdade de gênero que permeiam as relações sociais e afetivas. Conforme explica a oficial para Equidade de Gênero, Raça e Etnia do Fundo de População da ONU, Luana Silva, existe uma dificuldade de reconhecer a violência sexual no caso das mulheres que sofrem abusos do próprio companheiro ou marido.
“O imaginário construído sobre o papel social a ser desenvolvido pelas mulheres ajuda a perpetuar a crença de que estas pertencem aos seus parceiros, dificultando desde a decisão de formalizar a denúncia até a revitimização enfrentada pelas mulheres nos órgãos públicos. Pode se passar muito tempo, até que as mulheres consigam se desvincular da situação de violência e percebam que estão sendo violentadas”, explica Luana.
O relatório mostra que, nos países onde há dados disponíveis:
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Apenas 55% das mulheres estão completamente empoderadas para fazer escolhas a respeito de cuidados de saúde, contracepção e à habilidade de dizer sim ou não para o sexo
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Apenas 71% dos países garantem acesso total a cuidados gerais de maternidade
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Apenas 75% dos países garantem legalmente acesso total e equânime à contracepção
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Apenas cerca de 80% dos países têm leis apoiando a saúde sexual e o bem-estar
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Apenas 56% dos países têm leis e políticas apoiando a educação para a sexualidade
O relatório também documenta várias outras formas com as quais a autonomia ao corpo de mulheres, homens, meninas e meninos são violadas, revelando que:
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20 países ou territórios têm leis de “case-se com seu estuprador”, onde um homem pode escapar do processo criminal se casar com a mulher ou menina que estuprou
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43 países não têm legislação abordando o problema do estupro marital (estupro por cônjuge)
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Mais de 30 países restringem o direito das mulheres de se movimentar fora de casa
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Meninas e meninos com deficiência estão três vezes mais expostos à violência sexual, com meninas em maior risco.